25.11.08

A visita da Realidade


"Procuro o fio,
só há meada."
Caio


Não tem o que querer. É assim e pronto. Tem que ter. É do ser humano, é comum, é natural. E não adianta fazer essa cara de vômito porque você, meu filho, não é diferente de ninguém. De seu ninguém.
Então, pra quê tentar apagar suas pegadas se você, justo você, sabe muito bem por onde andou? Dependendo da sua pré-tensão, seu livro, seu caderninho, seu diário está ali, há meses.
Parado, sem uma linhazinha sequer pra contar história. Pra continuar a sua história que quer queira, quer não, existe.
Você já se deu o trabalho de se ler? Sério, pare e releia-se. Olha só a dedicação, o cuidado nas suas primeiras linhas. Caligrafia perfeita, ausência de erros gramaticais, tudo muito simétrico, tudo bom demais pra ser verdade.
Basta virar algumas páginas para que os erros apareçam. A princípio, podem até passar despercebidos, podemos até fingir que foi distração. Mas depois, amigo, ah, depois não adianta mais. As rasuras tornam-se constantes e você, se achando muito é do esperto, dá continuidade ao que já tinha se encerrado por si só. Porque às vezes, vou te re-lembrar, às vezes as histórias ganham autonomia. Independência, sabe? Às vezes as histórias desistem de você. Não adianta passar a borracha, não adianta pular páginas, deixar espaços em branco, fingir um recomeço. Não adianta.
Pelo que eu vejo aqui, você fez de um tudo para não se perder no próprio enredo. Intercalou capítulos desconexos, voltou atrás, persistiu, inovou e tentou. Tentou muito, eu sei. Dá pra ver o seu esforço nos últimos capítulos miúdos, fracos, sem consistência suficiente para se sobressaírem.
Esse menino, anota aí: não se transforma contos em romances.
E uma história só termina com um ponto final.
É por isso que eu vim aqui hoje. Pra te dizer mais uma vez tudo que você já sabia e te alertar de um detalhe que talvez você nunca tenha reparado.
As reticências que você utiliza todas as vezes na intenção de finalizar uma história, na verdade, significam apenas o silêncio. Significam omissão. As histórias não finalizadas, mais cedo ou mais tarde voltam à tona pra nos cobrar um final.
E convenhamos, antes um final triste do que uma história inacabada.

ilustração: eduardo recife

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